quarta-feira, 2 de junho de 2010

Sexo, Drogas, Rock'n Roll e Ditaduras


A década de 1960 foi palco de grandes agitações socioculturais pelo mundo. Época dos anos rebeldes, do “sexo, drogas e rock’n’roll”, de grandes revoluções comportamentais como o feminismo e até festivais musicais como o Woodstock.
No cenário político, o mundo ainda vivia o medo e a insegurança da Guerra Fria, conflito entre EUA e URSS que ameaçava eclodir a qualquer momento uma verdadeira guerra entre as duas superpotências do pós-guerra. Conforme conta Hobsbawm, “gerações inteiras se criaram à sombra de batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer momento e devastar a humanidade”.
Essa guerra não eclodiu, mas apesar da ausência de guerras diretas entre os Estados Unidos capitalista e a URSS comunista, vários foram os conflitos e movimentos apoiados e financiados pelas duas potências no intuito de manter os países que compartilhavam de sua ideologia longe da ameaça inimiga. Segundo Emir Sader, “o mundo da segunda metade do século não assiste a nenhum choque armado direto entre as duas grandes potências, embora elas estivessem vinculadas a praticamente todos os conflitos bélicos locais - e foram dezenas – que povoaram a segunda metade do século XX”.
Não obstante, os EUA não conseguiram evitar a Revolução Cubana e a conseqüente implantação do sistema socialista por Fidel Castro em Cuba, ilha a 120 km do território do Presidente Nixon.
A partir daí, a manutenção do sistema capitalista no mundo ocidental passou a ser intensificada e acompanhada mais de perto pelos norte-americanos. Uma estratégia bastante usada pelos EUA foi o apoio e financiamento a golpes militares de direita na América Latina para sufocar possíveis movimentos comunistas inspirados pela Revolução Cubana. Segundo Sader, “não foi somente pela inserção direta do continente nos conflitos da Guerra Fria que a Revolução Cubana marcou tão fortemente a segunda metade do século na América Latina. Seu impacto mais direto esteve ligado às reformas que introduziu em Cuba, no momento em que se esgotava no resto do continente o ciclo econômico do segundo pós-guerra e se instalavam várias ditaduras militares como conseqüência dos conflitos gerados por uma nova conjuntura política”.

E o receio por parte dos EUA de que outros países latino-americanos se espelhassem em Cuba era real, pois Cuba, que passou a ser aliada da outra superpotência, a URSS, precisava e planejava implantar seu regime em outros países latinos para não ficar isolada. De acordo com Ricardo Rojo, “era a necessidade urgente, para Cuba, de reconstruir seus laços com a América Latina, mas estes laços já não se podiam estabelecer sobre a base de relações entre países de regime político diferente, mas unicamente a partir de revoluções socialistas nos referidos países. Em 1963, Guevara enfrentou resolutamente a realidade americana com a intenção de obter resultados nessa linha. Se a América Latina capitalista se recusava a coexistir com a Cuba socialista, Cuba encarregar-se-ia de ajudar a todos os revolucionários para que seus países deixassem de ser capitalistas”.
Para se ter uma idéia, sete dos dez países sul americanos enfrentaram ditaduras militares durante a Guerra Fria. Foram eles: Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Bolívia, Equador e Paraguai - no Peru sobrevivia a ditadura do general Velasco Alvarado, sem que se possa enquadrá-la na tipologia antevista por Nixon.
No Brasil, o regime militar foi implantado em 31 de março de 1964 e teve seu auge em 1968 com a edição do AI-5, que dava poderes extraordinários ao Presidente da República e suspendia várias garantias constitucionais. Com isso, o governo fortaleceu a chamada linha dura do regime militar.
O que seguiria a partir daí seriam os Anos de Chumbo, auge das repressões sobre quem não concordasse com o Regime. É nesse cenário que a Rede Globo se fortalece, estréia o Jornal Nacional e passa a ser o meio de comunicação mais poderoso do país. Carlos Eduardo Lins da Silva afirma que, “nesse meio tempo [de 1957 até 1976], a Globo realizou uma revolução técnica, gerencial e artística na televisão do Brasil. Não parecia que iria chegar a tanto quando entrou pela primeira vez no ar o Canal 4 do rio de Janeiro. Em menos de quatro anos, assumiria a liderança absoluta de audiência, a ponto de convertê-la em virtual monopólio e tornar comum a acusação de que se transformara numa espécie de um ministério extra-oficial da informação no país” Para o músico e compositor Chico Buarque de Holanda, que teve várias de suas obras censuradas pela ditadura, a Rede Globo foi além da censura oficial. Chico Buarque conta que, “Eles proibiam minhas músicas, a censura proibia algumas músicas minhas, isso que era oficial do governo. Agora a TV Globo se encarregou de ser mais realista [...] e reforçar essa censura proibindo o meu nome. Eu acho que ele (Roberto Marinho) é mais poderoso que esse cidadão Kane inclusive. O cidadão Kane nunca imaginou que tivesse esse poder todo. O Roberto Marinho hoje é a força política mais importante em um país de 150 milhões de habitantes. Nada se faz sem consultar o Roberto Marinho. É assustador”.
A situação descrita por Chico Buarque parece ilustrar a ficção de George Orwell e o seu “Grande Irmão”. Quando seu personagem Winston, habitante de Oceania diz que, “o nome do cidadão era removido dos registros, suprimida toda menção dele, negada sua existência anterior, e depois esquecido. Era-se abolido, aniquilado; vaporizado era o termo corriqueiro”.