quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A mercantilização dos valores educacionais e o caso “Neymar Futebol Clube”


Foi-se o tempo em que os educadores tinham o pleno direito de exercer sua função primeira: a de educar pura e simplesmente. Foi-se o tempo em que o respeito ao mestre ocorria pela experiência e maior conhecimento daquele que ensina, seja um professor ou um treinador esportivo, e não pelo preço. A partir do momento em que tudo vira mercadoria e que, a regra é o lucro a qualquer custo, parece que nada mais é necessário além de parecer ser a “decisão mais cabida pensando no bem patrimonial da empresa”.
A verdade de que “manda mais quem pode mais” e, nesse caso, poder mais é “custar mais”, o dinheiro fica acima do que se poderia julgar normal e ético e coisas estranhas começam a acontecer. O professor (da rede privada) começa a ter que medir as palavras com os alunos, que se julgam no direito de fazer o que quiserem, pois a própria televisão os ensinam que a lógica dessa geração é a do “estou pagando”. Aprendem rapidamente que o valor que eles têm na sociedade é o valor que seus pais pagam de mensalidade e que professores desempregados têm aos montes por aí para substituir aqueles que foram ‘queimados’ por eles. “Melhor perder o professor do que as mensalidades”, pensam alguns donos de instituições de “educação (?)” privada no país. Na rede pública, apesar de não haver a questão da mensalidade, há os bônus pagos pelo governo para as escolas que tiverem bons resultados e ausência de alunos reprovados ou de recuperação. Certa vez, ao participar de uma reunião escolar de uma escola pública, ouvi uma certa professora dizer para uma aluna (do ensino fundamental), acompanhada da mãe, a seguinte e bizarra afirmação: “Você não será reprovada este ano, fique tranqüila, não iremos permitir. É bem verdade que você merece, mas não podemos perder o bônus que o governo nos paga no fim do ano”. Perdeu-se o respeito. Logo cedo a criança aprende que quando se trata de lucrar, dá-se um jeitinho, o famoso e cancerígeno 'jeitinho brasileiro'.
O que está acontecendo no futebol, símbolo maior de identificação nacional, segue a mesma lógica, porém, com proporção consideravelmente maior, claro. Perdeu-se por completo o respeito. Quem procura ‘educar’ determinados comportamentos recebe como prêmio a demissão. O caso Neymar – Dorival Jr, que está repercutindo por esses dias, é um exemplo claro dessa lógica, mas não é o primeiro e está longe de ser o último exemplo. “Estamos criando um monstro”, disse o treinador René Simões após o jogo entre Santos e Atlético GO, onde o jogador Neymar xingou, sem o menor pudor, o técnico e o capitão do seu time. O técnico bancou a punição do jogador e exigiu gancho por tempo indeterminado para o atleta. Após apenas um jogo de gancho, porém, o Santos exigiu a reintegração do jogador ao time, contrariando a decisão de Dorival Jr e resolveu mandar o treinador embora para poder escalar o jogador sem problemas. Imagino que o monstro que René Simões disse que estava sendo criado acaba de ganhar respaldo após essa decisão, pela lógica simples do “sou o mais caro aqui, logo, estou acima até dos meus superiores”.
Alguns meses antes, em maio de 2010, o treinador António Carlos Zago, também ganhou de presente sua demissão, quando dirigia o Palmeiras, após repreender e afastar um grupo de jogadores que haviam descumprido o horário combinado. Imagine em uma empresa o funcionário ser repreendido por não cumprir o horário estabelecido, reclamar e conseguir a cabeça do chefe. Inimaginável, não? Nem tanto, afinal, isso depende do lucro gerado pelo funcionário e não mais de valores morais.
Jogadores de futebol do porte de Neymar e, para realizar a analogia proposta por este artigo, alunos da rede privada, são mercadorias necessárias para a roda do sistema capitalista que estamos alimentando. Enquanto produtos, são intocáveis pois estão dando altos lucros para seus proprietários momentâneos. A bem dessa verdade, o capital social conquistado não é o intelectual mais, apenas o do preço, o do “quanto custa”. No mundo capitalista onde reina essa lógica respaldada pelos meios de comunicação de massa, que premiam o comportamento desses produtos midiáticos, saem de cena os valores morais e entram os valores monetários. Fica de fora a importância e a individualidade humana para dar lugar ao acúmulo de imagens fantásticas da sociedade espetacularizada em que vivemos.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Vincere: o cinema europeu e as vantagens de morar em uma grande cidade



Recentemente escrevi neste blog sobre a minha insatisfação com os filmes do circuito convencional (comercial). Uma verdadeira mostra do auge da ‘sociedade do espetáculo’: muito barulho para nenhuma arte, característica que para mim transforma os produtos exibidos nos shoppings em algo mais próximo de propaganda (de sonhos de consumo, lugares, personagens, produtos licenciados) do que da sétima arte. É claro que esse não é o problema de 100% do circuito comercial, mas infelizmente o número está próximo da totalidade.

Mas nem tudo é espetáculo no sentido pejorativo. E é ai que começam as vantagens de morar em uma grande cidade como São Paulo, onde há um circuito alternativo de cinema que nos faz lembrar que a sétima arte está viva e produzindo obras de arte de altíssima qualidade.

É claro que morar em uma metrópole tem seu preço e esse preço às vezes é bem alto. Não caber no metrô (quase que independente do horário), encarar filas enormes para praticamente qualquer coisa (do sorvete ao carregamento do bilhete único), encarar trânsitos astronômicos e respirar um dos piores ares do mundo... mas enfim, ao sofrer diariamente com esse tipo de situação tento ver as coisas boas antes que a cidade me enlouqueça por completo..

E o circuito de cinema alternativo é uma dessas vantagens que nos faz dar valor para a cidade. Após passar diversas vezes em frente ao cinema da Reserva Cultura, que fica no mesmo prédio da Cásper (estar lá está me transformando e isso mereceria um texto a parte), resolvi entrar ontem para ver um filme recomendado por um professor do mestrado. Trata-se de um filme italiano, de 2009, chamado “Vincere” (Vencer).

O longa, ao contrário de fazer barulho para vender, mostra o barulho feito pelo ditador italiano Benito Mussolini para se transformar no líder fascista da nação por meio do cinema e da panfletagem para construir o personagem heróico do “Il Duce”.

O enrredo, porém, é focado marginalmente no drama de Ida Dalser, amante de Mussolini que, achando ser a única mulher de Benito, vende tudo que tem para financiar a panfletagem que colocaria Mussolini sob os holofotes - é e negada pelo ditador logo em seguida a sua chegada ao poder.

O drama que mostra um evento histórico da Itália, ilustra um discurso político facilmente adaptável para realidades inclusive atuais e mostra o poder do cinema e do rádio no começo do século XX enquanto veículos de massa - cenário que serviu de ‘berço’ teórico para os pensadores da escola de Frankfurt.

Bom, fica a dica. Em São Paulo o filme está em cartaz no Reserva Cultural: http://www.reservacultural.com.br/detalhe_filme.asp?id=4&filme=10

e no Cine Sesc:

O filme está em cartaz também no Rio de Janeiro, Salvador e em Recife conforme dica do site: http://www.omelete.com.br/cinemas/programacao/?programacao=vincere

Veja o trailer:
http://www.youtube.com/watch?v=ldYi82S__kY